Amália Rodrigues, a Rainha do Fado

A música do fado nasceu nos bares e bordéis em Lisboa. Tradicionalmente, como canções de amor perdido, luto e fatalismo que eram acompanhadas por violões portugueses de 12 cordas e instrumentos de sopro. Tal como o blues dos Estados Unidos, o tango da Argentina e o flamenco da Espanha, o fado nasceu na pobreza, do desespero, e aos poucos foi sendo aceite.

Amália Rodrigues manteve o coração de uma nação por mais de 50 anos, cantando no estilo do seu país, as mais duradouras tradições da música popular, o fado. A partir da palavra Portuguesa para “destino”, o fado expressa o conceito Português de “saudade”.

Amália Rodrigues é conhecida como a “Rainha do Fado” e foi a mais influente na popularização do fado em todo o mundo.

Amália Rodrigues, a Rainha do Fado

Amália Rodrigues – Bibliografia

O nome completo era Amália da Piedade Rebordão Rodrigues. Amália Rodrigues nasceu em Lisboa por mero acaso, visto que os pais, Lucinda da Piedade Rebordão e Albertino de Jesus Rodrigues visitavam os avós maternos, na Rua Martim Vaz, concelho da Pena.

A data do seu registo de nascimento é 23 de julho de 1920. Dadas as dúvidas quanto ao dia exato, a artista adotou o dia 1 de julho como sendo o seu aniversário para o resto da sua vida.

Depois do seu aniversário e depois de ter passado uma curta temporada na capital na procura de uma vida melhor, os seus pais voltaram para o Fundão e deixaram a filha, então com quatorze meses, com os avós.

Quando tinha seis anos, os seus avós mudaram-se para o distrito de Alcântara, onde Amália Rodrigues viveu até aos 19 – primeiro com os avós, depois com os pais. Ela interrompeu os seus estudos depois de terminar a escola primária, porque precisava de trabalhar para sustentar a sua família. Foi aprendiz de costureira e bordadeira e trabalhadora numa fábrica de chocolates e doces. Mais tarde, juntamente com a irmã Celeste, vendia frutas nas ruas do cais de Alcântara e ganhava um percentual das vendas.

Desde muito cedo demonstrou o seu amor pelo canto e em 1935 foi nomeada solista para cantar o “Fado Alcântara” por ocasião das festas dos Santos Populares, juntamente com a Marcha Popular do seu distrito.

Em 1938 Amália fez uma audição para o “Concurso da Primavera”, em que cada distrito de Lisboa apresentou um candidato concorrente. O prémio atribuído nesse ano foi à rainha do Fado. 

Amália não participou no concurso, mas aí conheceu Francisco da Cruz, um guitarrista amador português com quem se casou em 1940. O casamento durou pouco, embora só se tivessem divorciado em 1949. Casou-se novamente no Brasil em 1961, com César Henrique de Seabra Rangel, o seu marido até à sua morte em 1997.

Entretanto continuou a cantar em festas noturnas com o nome de Amália Rebordão. Em 1938 a imprensa publicou a sua primeira fotografia e uma história muito lisonjeira (Guitarra de Portugal, 10 de agosto de 1938). Só mais tarde adotou o nome artístico de Amália Rodrigues, por sugestão de Filipe Pinto, então diretor artístico do Solar da Alegria.

Santos Moreira encorajou-a a fazer um teste no Retiro da Severa e estreou-se profissionalmente em 1939. Atuou neste local durante seis meses, mudando-se depois para o Solar da Alegria e Café Mondego. Ela teve um sucesso tão estrondoso que logo se tornou a principal estrela do elenco. 

Graças a José Melo, começou a cantar no Café Luso e foi paga como nenhuma fadista antes dela. Nessa altura a Amália deixou de se apresentar diariamente, cantava apenas quatro vezes por mês e era paga por cada atuação.

Amália Rodrigues, ao longo da sua vida, viajou muito e apresentou-se frequentemente no estrangeiro ao longo da sua longa carreira, nos cinco continentes. 

Amália Rodrigues gozou assim de um estatuto de excecional, marcado por uma carreira de sucesso e digressões por todo o mundo – não se limitando a espetáculos dirigidos às comunidades migrantes portuguesas.

As atuações de Amália Rodrigues podiam ser vistas também no teatro e no cinema, bem como ouvidas em inúmeras gravações em disco.

Amália Rodrigues introduziu também importantes inovações no comportamento e no figurino dos fadistas, que se tornaram verdadeiras convenções performáticas. Por exemplo, sempre de vestido preto e xale e de pé na frente dos músicos.

Amália Rodrigues – História e Destaques

Estreou-se no teatro em 1940, no Teatro Maria Vitória, com a peça “Ora vai tu!”. 

Até 1947 Amália Rodrigues integrou o elenco de vários espetáculos de vaudeville e opereta, nomeadamente “Espera de Toiros” (Teatro Variedades, 1941), “Essa é que é essa” (Teatro Maria Vitória, 1942), “Boa Nova” (Teatro Variedades, 1942), “Alerta está!” (Teatro Apolo, 1943), “A Rosa cantadeira”, “Ó viva da costa!” e “A Senhora da Atalaia” (Teatro Apolo, 1944); “Boa Nova” e “A Rosa cantadeira” (reedição no Teatro República, no Brasil, 1945), “Estás na Lua”, e reprise de “Mouraria” (Teatro Apolo, 1946); e “Se aquilo que a Gente Sente” (Teatro Variedades, 1946).

A partir de 1941 as suas atuações tornaram-se cada vez mais raras, embora pudesse ser ouvida a cantar na cidade de Lisboa até ao início dos anos 1950. Apresentou-se:

  • na Cervejaria Luso e Esplanada Luso, em 1941; 
  • em Casablanca, Pavilhão Português e Retiro dos Marialvas, em 1942; 
  • em Casablanca, Retiro dos Marialvas e Café Latino, em 1943; 
  • no Café Luso, em 1944 e de 1947 a 1950; 
  • no Casino Estoril, em 1949 e 1950, e no Comboio das Seis e Meia, espetáculo de vaudeville gravado no Teatro Politeama e depois transmitido na rádio, em 1950.

Estreou-se ao estrangeiro em 1943, para atuar numa festa de gala do embaixador de Portugal em Madrid, Pedro Teotónio Pereira. 

Amália Rodrigues encontrava-se acompanhada do cantor Júlio Proença e dos músicos Armandinho e Santos Moreira. 

Em 1944 viaja para o Brasil e apresenta-se no Casino de Copacabana, Teatro João Caetano e Rádio Globo. Voltou ao Brasil em 1945 e lá ficou até fevereiro de 1946. Durante a sua estadia fez as suas primeiras gravações – ou seja, oito edições de 78 rpm para a gravadora Continental.

Em 1949, a convite de António Ferro, atuou em Paris e Londres. 

A partir do início da década de 1950 Amália Rodrigues fez longas digressões no estrangeiro e as suas atuações em Portugal limitaram-se assim a alguns espetáculos anuais, como a Grande Noite do Fado, Natal dos Hospitais, o Casino Estoril Reveillon e outras festas e festivais, muitos deles programas de caridade.

Em 1950, deslocou-se à Madeira e ao estrangeiro para participar num conjunto de espetáculos patrocinados pelo Plano Marshall, em Berlim, Roma, Trieste, Dublin, Berna e Paris. 

Em 1952, apresentou-se em Nova York pela primeira vez, no La Vie en Rose, por 14 semanas consecutivas. 

Em 1953, Amália Rodrigues cantou na Ciudad de México e voltou para a cidade de Nova York onde teve participação no show de Eddie Fisher. Foi a primeira vez que um artista português apareceu na televisão americana.

O seu regresso ao teatro ocorreu somente em 1955.

Em 1956, a convite do empresário do Olympia de Paris, Bruno Coquatrix, teve um sucesso estrondoso nesta sala de concertos. Em seguida, apresentou-se na Côte d ‘Azur, Bélgica, Argélia, Rio de Janeiro e Ciudad de México.

Em 1957, regressou ao Olympia, acompanhada pelos músicos Domingos Camarinha (guitarra portuguesa) e Santos Moreira (guitarra espanhola). Realizou outros shows neste salão em 1959 e 1960. Em 1957 apresentou-se, igualmente, na Côte d ‘Azur, Estocolmo, Lausanne e Caracas.

Amália Rodrigues voltou ao Brasil com muitos shows em 1960 e 1961. Em 1963 cantou “Foi Deus” na igreja de São Francisco por ocasião do aniversário da independência do Líbano. 

Na década de 1960 atuou em Tunes, Argel, Sidi Abbes, Bruxelas e Atenas. Participou do Festival de Edimburgo e apresentou-se em várias cidades de Israel, no I Festival Internacional de Música de Brasov, em Leningrado, Moscou, Tiflis, Erevan e Baku, entre outras cidades e países.

Em 1962 a cantora lança o seu primeiro LP com composições de Alain Oulman, muitas vezes referidas como as “óperas” de Amália. Este disco, denominado “Busto” ou “Asas Fechadas”, deu início a uma colaboração que se prolongaria até 1975. Incluía discos em que o cantor interpretava, para além dos poetas acima mencionados, poemas do passado dos trovadores galego-portugueses, o Cancioneiro de Garcia de Resende e os Camöens, resultando em discos que viriam a ser marcos na história do fado – por exemplo:

  • “Fado Português”,
  • “Fado’67”,
  • “Vou dar de beber à dor”
  • “Com que voz”. 

Em 1965, Amália Rodrigues publicou o disco Amália canta Luís de Camões e o jornal Diário Popular, na sua edição de 23 de outubro de 1965,

Amália foi autora de muitos dos poemas que cantou e publicou em disco, alguns dos quais são os seus maiores sucessos. Esses poemas foram publicados em 1997 no livro “Versos”, da editora Cotovia. Alguns de seus títulos, por exemplo, são:

  • “Estranha forma de vida”,
  • “Lágrima”,
  • “Asa de vento”, 
  • “Grito”,
  • “Gostava de ser quem era”,
  • “Trago o fado nos sentidos”,
  • “Entrei na vida a cantar”,
  • ” Ai esta pena de mim “,
  • ” Lavava no rio lavava “,
  • ” Teus olhos são duas fontes “,
  • ” Fui ao mar buscar sardinhas “.

Em 1970, Amália Rodrigues viajou para o Japão pela primeira vez, onde retornou em 1976, 1986 e 1990. 

Em 1972, apresentou-se na Austrália. Durante as décadas de 1970 e 1980, ela manteve as suas tournées em vários países.

O seu primeiro concerto a solo em Portugal teve lugar a 19 de abril de 1985, no Coliseu dos Recreios de Lisboa – repetiu-se no Coliseu do Porto uma semana depois, a 26 de abril.

Em 1989 teve uma atuação gravada para a televisão espanhola, no contexto de um programa apresentado por Sara Montiel. 

Também em 1989 celebrou o 50º aniversário de atividade profissional com uma grande digressão por Espanha, França, Suíça, Portugal, Israel, Índia, Macau, Coreia, Japão, Bélgica, EUA e Itália. Durante essa turnê, ela teve sua oitava apresentação no Olympia de Paris.

Cinema e Poemas

A relação de Amália com o cinema começou com a interpretação do papel Maria Lisboa, co estrelada por Alberto Ribeiro no filme “Capas Negras” da direção de Armando Miranda. O filme estreou-se no teatro Condes a 16 de maio de 1947. Nesse mesmo ano estrelou, juntamente com Virgílio Teixeira, o filme “Fado, História de uma Cantadeira” dirigido por Perdigão Queiroga. 

Participou também, juntamente com Jaime Santos e Santos Moreira, em curtas metragens dirigidos por Augusto Fraga, nomeadamente “Fado da Rua do Sol”, “Fado Malhoa”, “Fado Amália”, “Fado lamentos”, “O meu amor na vida “,” Só à Noitinha “,” Ronda dos Bairros “,” Eu disse adeus à casinha “e ” Ai! Lisboa “.

Regressou ao cinema em 1949, ao lado de Manuel dos Santos no filme “Sol e Toiros”, de José Buchs, e de Paulo Maurício, no filme “Vendaval Maravilhoso”, de Leitão de Barros. 

Em 1955 co estrelou com Daniel Gelin no filme “Os Amantes do Tejo” de Henri Verneuil, no qual interpretou a canção “Barco Negro”, com letra de David Mourão Ferreira. Em 1955, com António dos Santos, filmou “Abril em Portugal” de Evan Lloyd.

As suas últimas participações no cinema datam de 1958, no filme “Sangue Toureiro”, de Augusto Fraga, em que cantou o fado “Que Deus me Perdoe”, de 1964, como longa-metragem do filme “Fado Corrido”, de Jorge Brum do Canto , baseado num conto de David Mourão Ferreira e em 1965, em dois filmes, nomeadamente “As Ilhas Encantadas”, de Carlos Vilardebó, rodado no Porto Santo, e “Via Macao”, de Jean Leduc.

O seu interesse pela poesia erudita foi outra novidade. No início da década de 1950, Amália Rodrigues gravou “Fria Claridade” de Pedro Homem de Mello e em 1953 o poema “Primavera” de David Mourão-Ferreira. 

A sua colaboração com estes dois poetas durou muito tempo e mais tarde ela emprestou letras de outros poetas, nomeadamente Luiz Macedo e Sidónio Muralha (1954), Alexandre O’Neill (1964), José Régio (1965), Vasco de Lima Couto (1967), Manuel Alegre e José Carlos Ary dos Santos (1970).

Celebração dos 50 anos da sua carreira profissional

A celebração dos 50 anos da sua carreira profissional em 1989 foi marcada por uma série de acontecimentos que se prolongaram até 1990, nomeadamente:

  • Um espetáculo no Coliseu dos Recreios, a 8 de janeiro de 1990;
  • A exposição “Amália Rodrigues. 50 Anos”, no Museu Nacional do Teatro, de junho de 1989 a março de 1990;
  • A retrospetiva de cinema “Amália no Cinema”, no Cinema Português, em novembro de 1989;
  • E uma grande turnê com shows na Espanha, França, Suíça, Israel, Índia, Macau, Coreia, Japão, Bélgica, EUA e Itália.

Aposentação

Aposentou-se dos palcos em 1994. Depois disso Amália Rodrigues continuou a ser convidada como convidada de honra de muitos eventos culturais, nomeadamente durante as Marchas Populares em Lisboa, no dia de Santo António. 

Em 1998 foi homenageada publicamente durante um espetáculo na Expo’98, no Parque das Nações de Lisboa.

Falecimento

Amália Rodrigues morreu em 6 de outubro de 1999. O seu funeral foi uma demonstração sincera de tristeza, dor e nostalgia. 

Toda a nação chorou por ela como sua Diva do Fado. Os seus restos mortais foram transportados do Cemitério dos Prazeres para o Panteão Nacional no dia 8 de julho de 2001.

Figura indiscutível na História do Fado

Amália Rodrigues é uma figura indiscutível na História do Fado e por isso uma referência chave na exposição permanente do Museu do Fado. 

Em junho de 2004, o Museu do Fado apresentou uma exposição “Amália, Gostava de Ser Quem Era”, que se manteve aberta ao público durante um ano.

Testamento

No seu testamento a cantora constituiu a Fundação Amália Rodrigues, oficialmente criada a 10 de dezembro de 1999, dois meses após a sua morte. 

Esta fundação realiza gala anual desde 2005, atribuindo os seguintes prémios: Carreira Feminina e Masculina, Revelação Feminina e Masculina, Internacional, Música Étnica, Guitarra Espanhola, Baixo, Guitarra Portuguesa, Cantora Feminina e Masculina, Discos, Fado Poeta, Compositor de Fado, Música Sinfônica, Fado Amador e Ensaio e Disseminação.

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